Termorregulação

Introdução

A temperatura corporal é um fator central na fisiologia animal, pois influencia diretamente a velocidade das reações físico-químicas e a estrutura tridimensional das proteínas, que são essenciais para praticamente todos os processos fisiológicos. Alterações térmicas podem modificar a afinidade de enzimas por substratos, a estabilidade de membranas celulares e o transporte de moléculas, impactando a homeostase. A capacidade de manter a temperatura corporal relativamente constante representa, portanto, uma importante vantagem evolutiva, garantindo estabilidade fisiológica diante de variações ambientais. No entanto, essa regulação térmica exige consumo energético significativo.

Animais que mantêm a temperatura corporal constante, independentemente do ambiente, são chamados homeotérmicos, enquanto aqueles cuja temperatura varia de acordo com o ambiente são heterotérmicos. Os termos pecilotérmico e poiquilotérmico também indicam organismos cuja temperatura corporal acompanha a variação ambiental. Endotérmicos e ectotérmicos referem-se à principal fonte de calor para o corpo, sendo, respectivamente, interna (ou seja, o calor gerado pelo próprio metabolismo) e externa (o calor ambiental). Mamíferos e aves são homeotérmicos e endotérmicos, enquanto répteis e anfíbios são heterotérmicos e ectotérmicos. É importante ressaltar que expressões populares como “animais de sangue quente” ou “animais de sangue frio” são imprecisas e não devem ser utilizadas.

A temperatura não é uniforme em todas as regiões do corpo. Órgãos metabolicamente ativos, como o fígado, produzem mais calor, enquanto extremidades, como patas, orelhas ou cauda, estão mais próximas da superfície e perdem calor com maior facilidade. Os tecidos do corpo, principalmente o adiposo, não são bons condutores de calor. Assim, o principal transportador de calor é o sangue. O sítio de perda de calor no corpo é a pele.

O centro de controle da temperatura está no hipotálamo, onde há células termossensíveis e onde chegam os estímulos sensoriais vindos de termorreceptores localizados na pele e em órgãos internos.

Transferência de calor

O corpo perde ou ganha calor por quatro mecanismos principais: condução, convecção, radiação e evaporação.

  • Condução: ocorre quando dois corpos estão em contato; o calor flui do corpo mais quente para o mais frio.
  • Convecção: o corpo aquece o ar ou a água ao redor; o ar aquecido, por se tornar menos denso, sobe e é substituído por ar mais frio, aumentando a perda de calor.
  • Radiação térmica: o corpo emite calor para o ambiente, mesmo à distância, principalmente por radiação infravermelha.
  • Evaporação: a molécula de água líquida absorve energia térmica para ser convertida em vapor, removendo calor do corpo.

A transferência de calor por condução, convecção e radiação térmica é mais eficiente quanto maior o gradiente térmico, ou seja, a diferença de temperatura entre quem fornece e quem recebe o calor. Assim, a evaporação é a única forma de perda de calor disponível para os animais endotérmicos quando a temperatura ambiente ultrapassa a temperatura do corpo. a perda de calor por evaporação será menos eficiente se o ar estiver saturado de vapor de água, ou seja, a umidade relativa do ar estiver alta.

Além desses mecanismos, pequenas perdas insensíveis de água pela pele contribuem para a termorregulação mesmo em animais sem sudorese intensa.

Respostas ao frio

Para conservar calor, os animais combinam respostas comportamentais e fisiológicas. Comportamentos incluem buscar locais aquecidos ou proteger-se do vento, ficar em uma posição “enrolada” para diminuir a área disponível para perda, ou se agrupar a outros indivíduos.

Respostas fisiológicas incluem:

  • Piloereção em mamíferos ou eriçamento de penas em aves, criando uma camada isolante de ar próximo à pele.
  • Espessamento da pelagem e aumento da camada de gordura subcutânea, reduzindo a condução de calor para o ambiente.
  • Vasoconstrição superficial, diminuindo o fluxo sanguíneo para a pele e extremidades.
  • Sistema de contracorrente nos membros: o sangue arterial quente transfere calor para o sangue venoso que retorna ao corpo, economizando energia térmica.

A produção interna de calor também aumenta:

  • Tremores musculares, que geram calor rapidamente.
  • Hormônios como adrenalina, noradrenalina e hormônios tireoidianos elevam a taxa metabólica basal.
  • A gordura marrom, presente em recém-nascidos e animais hibernantes, permite gerar calor sem contração muscular. Ela está localizada entre as escápulas, próxima aos rins e ao miocárdio. Sua função principal é produzir calor ao ser metabolizada para fins de termorregulação. Morfologicamente e fisiologicamente, a gordura marrom é diferente da gordura branca ou amarela, que atua principalmente como reserva energética e isolante térmico.

Respostas ao calor

Para evitar o superaquecimento, os animais dependem de mecanismos de dissipação térmica:

  • Vasodilatação superficial, aumentando o fluxo sanguíneo para a pele e facilitando a perda de calor por radiação e convecção.
  • Evaporação da água da pele ou das vias respiratórias, que é crucial quando a temperatura ambiente se aproxima ou ultrapassa a temperatura corporal. O ato de ofegar com o objetivo de termorregulação envolve a ventilação do espaço morto do aparelho respiratório, ou seja, apenas as vias aéreas, onde o ar é aquecido. A ventilação pulmonar aumentada pode induzir uma alcalose respiratória. Exposição da língua, aumento da salivação, lamber o corpo também são formas de aumentar a evaporação.
  • Sacos aéreos em aves auxiliam na dissipação de calor próximo a órgãos internos.
  • Comportamentos como buscar sombra ou lamber superfícies frias ajudam a reduzir a temperatura corporal.

Hipertermia e hipotermia

Quando os mecanismos termorregulatórios não são suficientes, surgem condições de desregulação térmica:

  • Hipotermia: ocorre quando a temperatura corporal cai abaixo do normal. Mesmo com mecanismos de defesa ativos, fatores como exposição prolongada ao frio, doença ou déficit nutricional podem impedir a manutenção da temperatura, prejudicando funções fisiológicas.
  • Hipertermia: aumento da temperatura corporal acima do normal, podendo ser controlado ou não.
    • Febre: é uma hipertermia controlada, em que o hipotálamo ajusta o ponto de referência da temperatura corporal (set point) em resposta a pirógenos endógenos ou microbianos. O corpo ativa mecanismos fisiológicos, como tremores iniciais e vasoconstrição, para atingir a nova temperatura “alvo”.
    • Intermação (heat stroke ou golpe de calor): é uma hipertermia não controlada, resultante de esforço físico intenso, calor ambiental extremo ou falha na dissipação térmica. Trata-se de uma emergência fisiológica, pois a temperatura elevada pode causar falência de órgãos e morte.

Considerações finais

A termorregulação envolve uma complexa integração entre metabolismo, transporte de calor, controle neural, adaptações comportamentais e estruturas especializadas, como glândulas sudoríparas e gordura marrom. Estudar suas estratégias permite compreender como diferentes espécies — cães, gatos, aves, cavalos, bovinos e até répteis — se adaptam a desafios ambientais variados, garantindo manutenção da homeostase frente a frio, calor, esforço físico ou doenças.