Pele

A pele é o maior órgão do corpo e funciona como a interface direta entre o organismo e o ambiente externo. É formada por duas camadas principais, a epiderme e a derme, sendo chamada de integumento (derivado do latim e significando “cobertura”). A espessura da pele varia entre espécies, entre indivíduos da mesma espécie e em diferentes regiões do corpo. Suas funções incluem atuar como barreira física, regular a temperatura, fornecer suporte mecânico, servir como receptor sensorial, participar do metabolismo e da biotransformação de xenobióticos e realizar secreção glandular.

Epiderme

A epiderme é um epitélio escamoso estratificado queratinizado, cuja espessura é inversamente proporcional à cobertura pilosa. Trata-se de um tecido em constante renovação, com processos contínuos de proliferação, diferenciação e queratinização, e apresenta especializações como pelos, glândulas sebáceas e sudoríparas, órgãos digitais e penas.

As células da epiderme podem ser divididas em queratinócitos e não queratinócitos.

Queratinócitos

Os queratinócitos formam a maior parte da epiderme, distribuindo-se da membrana basal até a superfície, e organizam-se em camadas:

  • Estrato basal (ou germinativo): é uma monocamada em contato com a membrana basal. Contém células-tronco responsáveis pela proliferação e reposição da epiderme, algumas das quais atuam principalmente na ancoragem do tecido.
  • Estrato espinhoso: corresponde à maior parte da espessura da epiderme, variando conforme a região do corpo. Recebe esse nome devido a um artefato histológico que causa retração das células, fazendo com que os desmossomos fiquem aparentes como “espinhos”. As células são poliédricas, adaptando-se umas às outras, e vão se tornando pavimentosas em direção à superfície.
  • Estrato granuloso: formado por células mais achatadas, ricas em grânulos queratohialinos, que participam do processo de queratinização e da formação da barreira epidérmica. Outros grânulos contêm lipídeos e enzimas que contribuem para adesão celular e impermeabilização.
  • Estrato lúcido: presente apenas em pele muito espessa e sem pelos, formado por camadas de queratinócitos sem núcleo completamente queratinizados. Algumas proteínas, diferentes da queratina, não coram, deixando a camada relativamente translúcida.
  • Estrato córneo: camada mais externa, composta por células totalmente queratinizadas e mortas, cuja espessura é variável. Está em constante descamação. Uma das proteínas estruturais importantes nesta camada é a involucrina.

O processo de queratinização inicia-se quando o queratinócito deixa o estrato basal. Ele passa a produzir tonofilamentos, grânulos queratohialinos e grânulos lamelares, que preenchem a célula. O núcleo e outras organelas se desintegram, os grânulos degranulam e a célula se transforma em queratinócito maduro. As fibras de queratina do estrato córneo são fortes e estáveis, graças a pontes dissulfeto, ligações de hidrogênio, interações eletrostáticas, forças hidrofóbicas e interações de van der Waals. O processo de queratinização ocorre em duas fases: fase de síntese e fase de transformação.

Não queratinócitos

Além dos queratinócitos, a epiderme contém outros tipos celulares:

  • Melanócitos: localizados na camada basal, derivados da crista neural. Possuem numerosos processos dendríticos que transferem melanina para os queratinócitos. A melanina é sintetizada a partir da tirosina, mediada pela tirosinase, passando por di-hidroxifenilalanina e dopaquinona até formar melanina. Os grânulos de melanina, chamados melanossomos, migram para as pontas dos processos dendríticos, que se destacam e são fagocitados pelos queratinócitos. A distribuição da melanina no queratinócito tende a formar um “capuz” entre o núcleo e o lado da célula voltado para o exterior, protegendo contra radiação ultravioleta. A melanina pode ser eumelanina (marrom/escura) ou feomelanina (acobreada/avermelhada), e sua formação é induzível, variando entre indivíduos e espécies.
  • Células de Merkel: células epitelioides táteis localizadas na região basal, com núcleo lobulado, conectadas às células adjacentes por desmossomos. Contêm vesículas com mediadores químicos e fazem sinapse com neurônios sensoriais, funcionando como mecanorreceptores para toque.
  • Células de Langerhans: macrófagos intraepidérmicos presentes no estrato espinhoso, sem desmossomos, que atuam como células dendríticas, participando da imunidade cutânea.

A epiderme não possui vasos sanguíneos e depende da difusão de nutrientes a partir da derme. Sua barreira física resulta da combinação do estrato córneo e das junções de oclusão, localizadas no estrato granuloso. Além da proteção mecânica, a epiderme contém peptídeos antimicrobianos, células de Langerhans e linfócitos T epidermais transientes, que contribuem para a defesa imunológica.

Na micrografia acima, é possível visualizar a epiderme e uma parte da camada papilar da derme. 1) estrato córneo; 2) queratinócito com grânulos, do estrato granuloso; 3) “espinhos” formados pela retração dos queratinócitos do estrato espinhoso, que mantêm suas junções desmossômicas entre as células; 4) estrato basal; 5) melanina; 6) papila dérmica, para aumentar área de adesão da junção epiderme-derme.

Junção Epiderme-Derme

A membrana basal conecta epiderme e derme e é formada por: hemidesmossomos, lâmina lúcida (ou rara), lâmina densa (ou basal) e lâmina sub-basal (ou reticular), garantindo adesão firme entre os tecidos.

Derme

A derme é constituída por tecido conjuntivo denso irregular, com fibras colágenas, elásticas e reticulares, imersas em substância fundamental amorfa composta por glicosaminoglicanos, proteoglicanos, glicoproteínas, água e íons. As células predominantes são os fibroblastos, mas também existem mastócitos e macrófagos.

Ela possui duas camadas principais:

  • Camada papilar: superficial e menos densa, contorna a base da epiderme e permite certo movimento para evitar que a epiderme seja arrancada.
  • Camada reticular: profunda e mais densa.

Dobras da derme, como as papilas dérmicas, aumentam a área de adesão com a epiderme. Na derme estão presentes diferentes receptores sensoriais, com terminais encapsulados ou não, que detectam toque, posição e temperatura. A concentração desses receptores varia conforme a região da pele, determinando diferentes tamanhos de campos sensoriais e permitindo respostas mais precisas.

Hipoderme

A hipoderme não faz parte da pele propriamente dita. É formada por tecido conjuntivo frouxo e tecido adiposo subcutâneo, funcionando como âncora frouxa para a pele ou músculo, permitindo mobilidade e protegendo contra fricção.

Anexos Cutâneos

Folículos Pilosos

O pelo é uma estrutura queratinizada e flexível, típica dos mamíferos, dividida em haste, raiz e bulbo.

  • Haste: composta por cutícula (uma camada de células queratinizadas achatadas), córtex (camada compacta de células queratinizadas) e medula (células cuboides ou achatadas).
  • Folículo: inclui matriz pilosa (bulbo), bainha radicular epitelial interna (desintegra-se próximo à glândula sebácea), bainha radicular epitelial externa (contínua com a epiderme) e bainha dérmica (tecido conjuntivo).

Associado ao folículo está o músculo eretor do pelo, composto por músculo liso e estimulado pelo sistema nervoso autônomo simpático, provocando piloereção e auxiliando na secreção de sebo.

Os folículos podem ser simples (um único pelo sai por poro) ou compostos (mais de um pelo por poro, cada um com seu bulbo). Também podem ser primários (maior diâmetro) ou secundários (menor diâmetro, sem medula nem músculo eretor associado, geralmente ao redor de um primário).

Pelos táteis são especializados em recepção sensorial e possuem um seio venoso ao redor do bulbo, que ajuda a reverberar estímulos para os terminais nervosos.

Ciclo do pelo

  • Anágeno: células do bulbo em mitose ativa.
  • Catágeno: fase regressiva, com encurtamento do folículo, ou seja, a porção inferior se desloca em direção à papila dérmica.
  • Telógeno: fase quiescente, com bulbo próximo à glândula sebácea.

Após o repouso, um novo folículo em anágeno se desenvolve abaixo do folículo antigo, empurrando o pelo antigo até sua queda. O ciclo é influenciado por genética, fotoperíodo, temperatura, nutrição e hormônios.

Glândulas Sebáceas

Glândulas alveolares, simples, compostas ou ramificadas, com secreção holócrina de sebo, que atua como agente antimicrobiano e impermeabilizante. Normalmente associadas aos folículos, apresentam células periféricas em mitose e células poliédricas no centro.

Glândulas Sudoríparas

  • Apócrinas: simples saculares ou tubulares, com porção secretória enovelada e ducto reto; secreção viscosa, função de comunicação; células mioepiteliais presentes. Nos ruminantes, o lúmen é mais dilatado.
  • Écrinas (merócrinas): simples tubulares, localizadas em áreas específicas; porção secretória cuboide; ducto com duas camadas de epitélio cuboide; células mioepiteliais presentes.

Na micrografia acima: 1) Derme; 2) Glândulas sebáceas; 3) Glândulas sudoríparas; 4) Músculo eretor do pelo; 5) Folículos pilosos.

Na micrografia acima: 1) Epiderme; 2) Folículo piloso de um pelo tátil; 3) Papila dermal do folículo; 4) Seio venoso.

Irrigação Sanguínea

Os vasos formam três plexos interconectados: subcutâneo, cutâneo e subpapilar. O organismo pode alterar o fluxo entre eles para fins de termorregulação.

Funções Complementares da Pele

Além da barreira física e da termorregulação, a pele:

  • Protege contra trauma físico e químico, microrganismos e radiação.
  • Evita perda excessiva de água.
  • Participa da absorção e síntese de vitamina D (menos importante em animais domésticos que em humanos).
  • Expressa enzimas comuns ao fígado (hidrolases, citocromo P450, transferases, sulfatases) e mecanismos de influxo/efluxo de xenobióticos, embora com capacidade menor.
  • Abriga microbiota que contribui para síntese de vitaminas e aminoácidos, inibe patógenos, modula imunidade e regula diferenciação epidérmica.

A pele é, portanto, um órgão dinâmico, complexo e essencial, integrando proteção, percepção sensorial, metabolismo e interação com o ambiente de forma coordenada.

Referências

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